domingo, 29 de junho de 2008

conversa fiada

Sabe Deus, o que mais me dói é ainda sentir. Sentir não a dor de sentir o que sinto mas, sim, a dor profunda que corrói o estômago quando as lembranças vêm à tona. Dor que arrebenta, estoura as vísceras. Sabe Deus, já cansei de pedir. Quanto mais eu peço, mais me lembro. E dói, se o Senhor não sabe. Desculpe-me se tão rudemente me dirijo. Mas é que não comporto o dom das lembranças. Não sou capaz de carregar o fardo árduo, a sina triste. Me dê outra tarefa. Não menos árdua que essa. Mas que me transporte para outro mundo. Qualquer outro lugar que seja meu. E não a representação barata de um mundo que dizem ser o seu.

terça-feira, 10 de junho de 2008

10 de junho

Hoje é aniversário do nada. Comemoração vazia, festa muda, alegria calada. Hoje brindo em comemoração às cinzas. Festejo o dia que não aconteceu. Enfeito a casa e me enfeito. Sento junto à porta e espero. Espero os convidados que não convidei. E, quando cansar de esperar aqueles que não virão, vou abrir um vinho e comemorar, sozinha, junto ao som ou à televisão. Acenderei a vela do bolo, cantarei parabéns sozinha. E, sozinha, irei apagá-la. Ao apagar, entoarei mudamente meu único pedido. Corto o bolo, distribuo os pedaços em pratos. Um pedaço para cada convidado que não veio. Comerei o pedaço que me cabe. Tomarei meu copo de vinho. E, novamente, irei juntar-me ao som. Trocando compulsivamente os discos que tocavam um ano atrás. Quem sabe a música refaça o dia.